Lorena Chaves


“Quando te vi, os meus dias nasciam com dois sois.
Meu mundo girava ao seu redor.
O céu tinha tantas cores que eu não pude nem contar.
Me diz quanto custa o teu sorriso, me diz onde eu posso encontrar.
E agora eu sei, eu vou aonde o seu vento me levar .”

E de quando em vez, os sons tortos se alinham e trazem uma bela e alegre novidade. Depois de literalmente estuprar o play de tanto ouvir essa voz, trago a todos o frescor e a qualidade de Lorena Chaves.  Pra quem não conhece a cantora em questão, ela participou de um programa de auditório da TV Record (Ídolos) em 2008, sendo uma das finalistas daquela edição.

Contagiante! Essa é a palavra que expressa o trabalho de Lorena, em seu primeiro álbum, carregado de maturidade, melodias deliciosas e o verso instigante de um trabalho bem feito.

Com todas as faixas autorais, Lorena Chaves traz um ar de ousadia com suas rimas largadas e com seus acordes interessantes.

Chega de papo! Aumente os sentidos, diminua o silêncio e aproveite:

E aí, o que achou do som? Participe, comente e compartilhe!

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Fim de Peça

O pano caiu e as portas do teatro se abriram. A multidão foi em direção à saída com o mesmo desespero que se naquele mesmo teatro houvesse um homem-bomba ameaçando se explodir e levar todo aquele povo junto. Alberto seguiu o fluxo e desceu as escadas do teatro já com a chave do carro em mãos. Ele precisava ser ágil para que nenhum ator do elenco o visse saindo à francesa.

– Alberto?! – gritou uma voz feminina do alto da escada.

Ele fingiu que não era com ele e seguiu.

– Alberto Caldas Martinelli! – gritou a voz em alto e bom tom.

Todo o público que aguardava no hall de entrada ficou em silêncio e alternava a cabeça entre a mulher e Alberto. Ele ficou estático por alguns segundos no mesmo lugar e virou-se lentamente para a mulher com um largo sorriso no rosto.

– Alma! – gritou ele.

Alma estava ainda com a maquiagem e o mesmo figurino da sua personagem da peça. A atriz desceu a escada rapidamente, um pouco desajeitada e completamente eufórica, e abraçou Alberto.

– Querido, nem acredito que você veio! – gritou ela.

– Pois é, nem eu acredito. – disse ele retribuindo o abraço.

– Estou muito feliz. Obrigada por ter vindo.

– Imagina, obrigado você por ter me convidado. – retrucou ele.

Alberto sabia que mais cedo ou mais tarde a pergunta mais temida iria chegar. A conversa já se encaminhava para aquele momento e tudo indicava que ela estava próxima. Não deu outra. Alma soltou:

– E aí, o que achou? – perguntou ela entusiasmada com um sorriso incrivelmente assustador que ocupava metade do seu rosto.

Alberto engoliu em seco. Foram duas horas e trinta e sete minutos de peça. Ele perdera as contas de quantas vezes havia conferido o seu relógio para ver o tempo que ainda restava. Durante essas quase três horas, quarenta atores se revezaram no palco, sob a mesma luz!, com textos que não faziam o menor sentido. O ápice do espetáculo, para Alberto, foi quando uma senhora, com seus sessenta anos, na segunda fila, dormia com a boca aberta e uma mosca pousava perto de seus lábios ameaçando entrar.

– Fala tudo, Alberto! – disse Alma.

A vontade de Alberto era dizer toda a verdade nua e crua.

DIÁLOGO DOS SONHOS DE ALBERTO

Alma: E aí, o que achou?

Alberto: Horrível. Uma bosta horrível.

Alma: Tão ruim assim?

Alberto: Sim, tão ruim assim. Uma das piores coisas que eu já assisti na minha vida. Nunca mais me convide para assistir uma porcaria dessas. A peça é horrível. Direção fraca, texto fraco, elenco fraco. E você é péssima, Alma. Péssima. Desista disso tudo e vá buscar outra profissão, mulher! Você me irrita em cena até mesmo quando está calada. Essa sua obsessão em querer atuar e chamar mais atenção do que os outros é insuportável. Eu odiei. E quero meu dinheiro de volta.

Alma: Claro, como quiser. Peço mil desculpas, Alberto, por ter feito você passar por esta experiência tão ruim. Você será reembolsado.

Mas o diálogo dos sonhos era bem distante da realidade e possivelmente resultaria no fim da amizade de Alma e Alberto. Ele, portanto, fez um grande esforço internamente e soltou um sorriso forçado.

– Achei foda. – disse ele sorrindo.

Mas como esse tipo de comentário não sacia nenhum ator, Alberto sabia que a jornada estava somente começando. Alma insistiu:

– Tá, mas fala mais! – disse ela animada.

– Foda, foda, F-O-D-A. – repetiu ele tentando procurar outras frases ambíguas de impacto que pudessem ser ditas de forma sincera baseando-se em um dos sentidos delas. – Que texto foda. Até agora não consegui digerir tudo. – completou ele.

– Ai, sério, Albertinho?! Que lindo ouvir isso de você. Mas me diz, o que você entendeu daquela cena final da vela?

“Filha da puta”, pensou Alberto.

– Qual cena da vela? – perguntou Alberto fingindo não lembrar.

– A penúltima cena, que a menina sobe na cadeira com o lençol.

Alberto sabia exatamente de qual cena ela se referia. Era a cena mais longa e sem pé nem cabeça do espetáculo.

– Ah, sei. Impactante! Muito impactante. Um tapa na cara do espectador. – disse ele.

– Mas o que você entendeu? – insistiu ela.

– Ah, tanta coisa, Alma. Não é toda dia que se vê uma cena tão… tão…

Alberto tinha prometido para si mesmo que iria tentar até o seu limite seguir falando a verdade, mas nesse momento ele decidiu que era hora de chutar o balde e partir para os elogios mais mentirosos e comentários nonsense que iriam confortar o gigante ego da atriz.

– … uma cena tão bela. Aqueles trinta e sete minutos são incríveis. É um silêncio perturbador, mas ao mesmo tempo confortante, pois ele escancara toda essa amargura das personagens. E a vela… Ah, a vela! O fogo da vela representando a chama que existe acesa no coração da personagem é emocionante demais. Aquele lençol em que ela se esfrega durante VINTE MINUTOS representando a paixão pela arte é sensacional.

– Sim, era exatamente isso que nós queríamos passar nessa cena! – disse ela.

“Mentirosa.”, pensou Alberto. “Nem você entendeu absolutamente nada do que aconteceu nesses trinta e sete minutos. Aposto que estava angustiada deitada no chão revirando-se na coxia”.

– Bom, eu vou indo nessa. – disse ele. – Meu carro está no estacionamento aqui do lado e daqui a pouco eles vão fechar.

– Não, eles fecham só às 2h. – disse ela sorrindo.

Alberto olhou no relógio, ainda eram 23h50.

– Que sorte a minha! – respondeu ele.

– E o que você achou do espetáculo como um todo?

Um silêncio embaraçoso tomou conta da conversa. Alberto corria loucamente pelo seu insconciente à procura de alguma resposta esfarrapada que pudesse parecer franca, porém não encontrava. A este ponto, o silêncio já passava dos cinco segundos, o que numa conversa já pode ser considerado o que chamamos de “O Clássico e Belo Momento Constrangedor”. Alberto decidira quebrar o mais rápido possível:

– Que texto, hein? Que texto! Ele não me parece estranho. É um texto familiar. Quem é o autor mesmo? – perguntou ele.

– É um texto coletivo, é uma colagem de vários monólogos que todos os atores escreveram durante o processo.

– Ah.

Primeira bola fora.

– Tiro o meu chápeu pra vocês. Texto muito profundo. – disse ele com um sorriso amarelo.

– E o que você achou de mim? – perguntou Alma.

Pronto. A conversa havia chegado no seu ápice e no momento em que Alberto tinha tentado evitar durante todo o tempo. Pior que o texto da peça, somente a atuação de Alma. A atriz era péssima. Alberto sabia que por mais que ele tentasse mentir nessa resposta, tudo sairia de forma robótica e falsa e ela descobriria toda a farsa que aquele diálogo havia sido. E além disso tudo, Alma era amiga de Alberto. A conversa tinha chegado no seu segundo silêncio constrangedor, silêncio que nesse tipo de situação é inevitável. Nesta altura do campeonato, Alberto já pensava em fingir receber uma ligação urgente de sua mãe pedindo socorro ou algo trágico na família, mas ele concluiu que não conseguiria passar verdade e soaria mais falso do que responder à pergunta de Alma. Ele, portanto, prosseguiu:

– Você é diferente de tudo o que eu já vi. Nunca vi nenhuma atriz colocar tanta alma em cena. – disse ele. Alberto sabia que o trocadilho com o nome de Alma era algo que fazia a atriz ficar encabulada e boba.

– Obrigada, Alberto. É muito bom ouvir isso, ainda mais de você. Não sabe o quanto significa pra mim. E o que você achou daquela minha cena em que eu canto? – perguntou ela.

“Mas você é muito desgradaçada mesmo.”, pensou Alberto. Parecia um teste psicológio que Alma estava aplicando. A cena em que Alma cantava só não era a pior do espetáculo porque as outras cenas conseguiam ser tão ruins quanto àquela. A cena da cantoria causou vergonha alheia em Alberto e o fez agonizar na poltrona.

– Você arrebentou, destruiu, quebrou tudo naquela cena. – disse ele.

– Ah, você sempre tão generoso.

Ela o abraçou novamente.

– Agora eu realmente preciso ir, Alma. Preciso ir para casa, amanhã acordo cedo.

– Ah, que pena. Tudo bem. Vamos marcar alguma coisa durante essa semana pra discutir sobre a peça.

“Nem ferrando.”, pensou Alberto.

– Claro, vamos sim. – respondeu ele. – Tchau.

Eles trocaram beijos e Alberto foi em direção ao elevador com pressa.

– Divulga para os amigos! – gritou Alma.

“Não divulgo nem pra inimigo.”, pensou ele.

– Vou sim. Pode deixar! Parabéns pela peça!

E Alberto saiu correndo.

 

Thalles Cabral

 

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